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Série Documentos da imigração alemã em Cachoeira: um requerimento sobre casamento acatólico

No dia 25 de julho de 2024 serão completados 200 anos da imigração alemã para o Brasil, data que marca a chegada dos primeiros imigrantes ao atual município de São Leopoldo - RS.

Em Cachoeira, o primeiro grupo de imigrantes alemães chegou em novembro de 1857, para se estabelecer na Colônia Santo Ângelo. As tratativas para instalação da colônia de imigrantes foram conduzidas pelo governo provincial em conjunto com a Câmara Municipal da Vila da Cachoeira, o que gerou farta documentação hoje preservada no acervo do Arquivo Histórico.

IM/S/SE/Requerimentos - Caixa 10

Ill.mo Snr Coronel Intendente do Municipio Cachoeira

Diz Wilhelm Naumann, Pastor da Communidade Evangelica do Agudo, ex-colonia Santo Angelo, que, sendo lhe pedido pelo Consulado do Imperio da Allemanha, a certidão de casamento do finado subdito allemão Max Skerlo e de sua mulher Luisa Schlay, o qual celebrou-se, em conformidade com o rito da Igreja Evangelica, no anno de 1885 n'esta freguezia, sendo porem, em vista da disposição do então regimen: que exigiu o registro dos casamentos acatholicos na secretaria da Comarca Municipal, a fim de tornarem-se legitimos, a só exhibição da certidão ecclesiastica insufficiente, para provar a legitimidade d'este matrimonio, é necessario que se verifique se os conjuges acima mencionados cumpriram com os preceitos da Lei, tendo os dado a registro o seu referido matrimonio.

Portanto

Pede à V.S.ª que digneis ordenar ao Snr. Secretario da Intendencia, que passe por certidão o que ha ou não, a respeito, no competente livro, offerecendo o supplicante pagamento das custas.

Nestes termos

E. R. M.ce

Freguezia de São Bonifacio, em 14 de Abril de 1898

W. Naumann,

Pastor Evangelico.

Com o documento acima, o blog começa a fazer registros sobre a presença alemã em Cachoeira. Tais registros servirão para expor parte da documentação existente no acervo sobre o tema, a exemplo do que fez em 2022 quando foram celebrados os 270 anos do povoamento açoriano no Rio Grande do Sul. A cada mês, procurando coincidir datas, serão publicados documentos e o contexto em que foram emitidos.

O requerimento do pastor Naumann, constante em IM/S/SE/Requerimentos - Caixa 10, expõe uma situação resolvida depois de muita discussão a respeito das relações entre a Igreja e o Estado, entendida aqui a igreja como a católica, que no Império era responsável pelo registro dos nascimentos, casamentos e óbitos da população.

Com a ocorrência da imigração de povos europeus para o Brasil e os diferentes credos destas populações, uma parcela significativa de pessoas, por não professarem a religião oficial do país, ficavam de fora dos registros. Questões de matrimônio, por exemplo, há tempo vinham exigindo estudos das autoridades e acabaram por tirar da Igreja Católica, no ano de 1863, a exclusividade na realização oficial do casamento religioso. 

Em 2 de agosto de 1872, o Barão von Kahlden, diretor da Colônia Santo Ângelo, encaminhou um abaixo-assinado à Câmara Municipal de Cachoeira solicitando que fossem abertos livros para que o oficial secretário fizesse os devidos registros dos casamentos entre protestantes, ou dos "acatólicos", como nele constam. Estes registros, constantes em CM/S/SE/RC-001 e 002, têm servido para confirmação de muitas uniões, especialmente para interessados em reconstituírem suas origens familiares.

Livros de registros dos casamentos acatólicos - CM/S/SE/RC-001 e 002 (1873 a 1888)

O primeiro registro feito no livro nº 01 foi o extrato do assento original do casamento de Guilherme Wilke com Henriqueta Ernesta Röpke, realizado na Colônia Santo Ângelo em 27 de setembro de 1870 e transcrito do original pelo secretário da Câmara Municipal da Vila da Cachoeira, Fidencio Pereira Fortes, em 4 de julho de 1873.

O último extrato, feito no livro nº 02, foi do casamento de Ludwig Kasulke e Wilhelmine Vöse, realizado em 20/8/1869 e transcrito em 15 de junho de 1888, ou seja, 19 anos depois de celebrado.

Quanto ao requerimento do pastor Wilhelm Naumann, o secretário Antonio Antunes de Araujo informou, em 18 de abril de 1898, "... que revendo os livros de registro de contractos de casamentos de acatholicos, existentes nesta Intendencia, nada consta com referencia ao subdito allemão Max Skerlo...", conforme anotação aposta no verso do documento.

MR

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