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Movimentos emancipatórios

Por ocasião da instalação do município de Cachoeira, em 5 de agosto de 1820, o território da Vila Nova de São João da Cachoeira era o maior do Rio Grande do Sul. Ainda no século XIX, por lei de 12 de novembro de 1832, começaram as emancipações de distritos submetidos política e administrativamente a Cachoeira, tendo início com a separação de Alegrete, que levou consigo Livramento, e Caçapava com São Gabriel. Santa Maria seguiu os demais em 1857. Em 1859, quando Cachoeira foi elevada ao foro de cidade, na mesma data também obteve esta concessão o município de Bagé, oriundo também da grande Vila Nova de São João da Cachoeira.

O território da Vila Nova de São João da Cachoeira - 1822


Na segunda metade do século XX, o processo de emancipação de distritos ganhou força política e popular. No ano de 1959, os distritos de Faxinal do Soturno, Agudo e Restinga Seca separaram-se de Cachoeira do Sul, constituindo novos municípios. Mas o processo começou bem antes, com discussões comunitárias, pressões políticas e finalmente plebiscitos.

Há 60 anos, no dia 30 de novembro de 1958, o Jornal do Povo publicou: Hoje o Plebiscito Para Decidir as Emancipações de Três Distritos. Diz a notícia:

Jornal do Povo, edição de 30/11/1958, p. 1

Conforme é do conhecimento público, realizam-se, hoje, nos distritos de Agudo, Dona Francisca e Restinga Sêca, as consultas populares para opção pela emancipação ou não dêsses distritos do Município de Cachoeira do Sul. 

As discussões estavam grandes, prova disto é que o Jornal do Povo enviou um repórter para cada distrito a fim de colher as manifestações das pessoas envolvidas, sendo que prevalecia a vontade pela emancipação. O clima em Agudo e Restinga Seca estava tranquilo, o mesmo não acontecendo em Dona Francisca:

O plebiscito para a decisão da sorte dêsses três distritos não tem problema algum, exceto no distrito de Dona Francisca, onde a escôlha da sede do futuro Município criou um sério problema com a divisão de opiniões. Como se sabe, Dona Francisca, Faxinal do Soturno e São João do Polêsine disputam a primazia da sede e uma intensa e agitada campanha vem se desenvolvendo nesse sentido, o que veio dar outro colorido ao movimento emancipacionista, já que não existe a identidade de pontos de vista e opiniões registrados em Restinga Sêca e Agudo.

Na mesma edição do Jornal do Povo, na página 5, foi estampado o mapa do futuro município de Restinga Sêca, com a seguinte legenda:

Êste mapa encerra uma rica zona que compreende o 4.º distrito de Cachoeira do Sul que nesta data histórica atinge a sua emancipação política através da Consulta Plebiscitária que hoje se realiza no Estado.


Mapa do futuro município de Restinga Seca - Jornal do Povo, 30/11/1958, p. 5

Pela redação da nota fica claro que a vitória da emancipação era certa, o que acabou por se concretizar para Restinga Seca oficialmente em 25 de março de 1959.

Na página seguinte, o mesmo Jornal do Povo estampa: O Centenário Agudo Deverá Tornar-se Município. Arroz, Fumo e Banha, a base da economia agudense - Sua pujança reserva-lhe grande futuro.

Agudo conquistaria a emancipação em 16 de fevereiro de 1959, precedido de Faxinal do Soturno em 12 de fevereiro do mesmo ano. Na esteira destes distritos, Paraíso do Sul e Cerro Branco se emanciparam de Cachoeira do Sul no final da década de 1980, ambos em 12 de maio de 1988, concluindo com Rincão dos Cabrais em 22 de outubro de 1995.

E Dona Francisca? Dona Francisca, que disputava com Faxinal do Soturno e São João do Polêsine ser a cabeça de novo município só conseguiu se emancipar de Faxinal do Soturno, o vencedor da disputa do final dos anos 1950, em 17 de julho de 1965, sendo instalado em 19 de fevereiro de 1967.

Como apropriadamente escreveu o Jornal do Povo quando apresentou o mapa de Restinga Seca, os distritos emancipados encerravam "uma rica zona" de produção. Hoje é possível verificar que suprimindo a rica zona de produção, Cachoeira do Sul teve que amargar perda de influência, de importância política e um consequente enfraquecimento econômico.

MR

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