Pular para o conteúdo principal

Do tempo dos lampiões

Há muito tempo atrás, quando a luz elétrica ainda não havia chegado por aqui, os recursos para iluminação das casas e ruas eram as lamparinas e lampiões. Nas ruas principais da cidade, havia maior profusão de lampiões, rareando os focos de luz conforme os caminhos conduziam para os arrabaldes.

Registros fotográficos dos últimos lampiões - fototeca Museu Municipal

Em 1911, um recibo do tesoureiro da Intendência da Cachoeira atesta que havia sido gasta a quantia de quinze mil e quinhentos réis com o trabalho de acendimento dos nove lampiões da avenida na Praça José Bonifácio, no período dos 31 dias do mês de julho, ao custo de 500 réis por noite. O acendedor, que se chamava João José Rodrigues, era também o jardineiro da Intendência. Provavelmente, para engrossar os rendimentos de jardineiro, João José se desdobrava trabalhando também à noite no acendimento dos lampiões...

Recibo de pagamento do acendedor de lampiões
- IM/RP/SF/D-102
Aliás, os lampiões desapareceram no tempo, substituídos pela energia elétrica, mas algumas das árvores plantadas nas praças de Cachoeira, especialmente na Praça José Bonifácio, pelo jardineiro João José, ainda se mantêm, testemunhando trabalho praticamente anônimo.

Praça José Bonifácio provavelmente ajardinada por João José Rodrigues
- fototeca Museu Municipal

Em agosto de 1911, outra despesa relativa ao serviço de iluminação tem o comprovante preservado na documentação histórica, desta vez no montante de 270 mil réis e relativa ao custeio de cem lampeões da illuminação publica desta cidade, quantia paga a João Henrique de Carvalho. Em 31 de outubro, a despesa de 302.400 réis já dava um total de 112 lampiões.

Como se vê, os gastos com a manutenção dos lampiões se ampliava conforme o crescimento de seu número, pois a cidade em expansão necessitava também promover o alcance da iluminação pelos novos rumos que se abriam.

O trabalho de acendimento - e de extinção das chamas dos lampiões - exigia a contratação constante de mão de obra, pois uma única pessoa não tinha condições de dar conta sozinha da exaustiva e, aos olhares de hoje, tão obsoleta tarefa.

EM TEMPO: Nosso atento leitor, colaborador e pesquisador dos acervos de documentos e imprensa do Arquivo Histórico, Hilberto Prochnow, fez importante observação sobre a postagem Do tempo dos lampiões, que registramos aqui. Intervenções como esta são importantíssimas para acrescentar e retificar informações, indo ao encontro do compromisso do Arquivo Histórico em difundir a história de Cachoeira com isenção, comprometimento e fidedignidade.

Hilberto Prochnow chama a atenção que o recibo assinado pelo jardineiro João José Rodrigues na verdade foi feito a rogo de Luiz Affonso, este sim o acendedor de lampiões. Provavelmente analfabeto, Luiz Affonso, na companhia do amigo jardineiro, dirigia-se ao tesoureiro da Intendência para o recebimento da soma que lhe era devida, para o que João José dava o recibo.

Para enriquecer ainda mais as observações feitas, o colaborador Hilberto Prochnow informa que João José Rodrigues, o jardineiro da Intendência, era português, nascido em 15 de janeiro de 1850 e falecido aos 88 anos, em 30 de março de 1938.

Muito obrigada, Hilberto! A postagem segue na íntegra para que os leitores possam perceber as observações feitas.

(MR)

Comentários

  1. Cachoeira do Sul é uma das cidades mais antigas do RS e é cheia de detalhes e histórias. Fico feliz que isso não esteja sendo esquecido pela nova geração. Parabéns pelo trabalho.

    ResponderExcluir
  2. Me ocorreu perguntar porque simplesmente não passaram os fios e a devida instalação elétrica deixando os lampiões.....

    ResponderExcluir
  3. Mirian,
    Acredito que o acendedor de lampiões era Luiz Affonso, mas como ele deveria ser analfabeto, não tinha condições de escrever e assinar o recibo de pagamento.
    Então o jardineiro João José Rodrigues ("por Luiz Affonço") o fez.
    Luiz Affonso também ocupava o cargo de zelador do Mercado Público em março de 1912 recebendo 12$000 Réis por mês.
    João José Marques Rodrigues nasceu em Portugal em 15/01/1850 e faleceu dia 30/03/1938, viúvo com 88 anos.
    (O Commércio-06/04/1938-pág.1)

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Casa da Aldeia: uma lenda urbana

Uma expressão que se tornou comum em nossos dias é a da "lenda urbana", ou seja, algo que costuma ser afirmado pelas pessoas como se verdade fosse, no entanto, paira sobre esta verdade um quê de interrogação!  Pois a afirmação inverídica de que a Casa da Aldeia é a mais antiga da cidade é, pode-se dizer, uma "lenda urbana". Longe de ser a construção mais antiga da cidade, posto ocupado pela Catedral Nossa Senhora da Conceição (1799), a Casa da Aldeia, que foi erguida pelo português Manoel Francisco Cardozo, marido da índia guarani Joaquina Maria de São José, é mais recente do que se supunha. Até pouco tempo, a época tida como da construção da casa era dada a partir do requerimento, datado de 18 de abril de 1849, em que Manoel Francisco Cardozo: querendo elle Suppl. Edeficar umas Cazas no lugar da Aldeia ecomo Alli seaxe huns terrenos devolutos na Rua de S. Carlos que faz frente ao Norte efundos ao Sul fazendo canto ao este com a rua principal cujo n...

Instituto Estadual de Educação João Neves da Fontoura - 90 anos

O mês de maio de 2019 está marcado por um momento significativo na história da educação de Cachoeira do Sul. No dia 22, o Instituto Estadual de Educação João Neves da Fontoura chegou aos seus 90 anos carregando, neste transcurso de tempo, desafios, dificuldades e conquistas. Muitas crianças e jovens passaram por seus bancos escolares, assim como professores e servidores dedicados à desafiadora tarefa educativa. A história do João Neves, como popularmente é chamado aquele importante educandário, tem vínculos enormes com seu patrono. Em 1929, quando a instituição foi criada com o nome de Escola Complementar, o Dr. João Neves da Fontoura era vice-presidente do estado e há pouco havia concluído uma gestão de grandes obras como intendente de Cachoeira.  Em 1927, ano em que Borges de Medeiros resolveu criar escolas complementares no estado para a formação de alunos-mestres, imediatamente João Neves empenhou-se para que uma destas escolas fosse instalada em Cachoeira, município p...

Série: Centenário do Château d'Eau - as esculturas

Dentre os muitos aspectos notáveis no Château d'Eau estão as esculturas de ninfas e Netuno. O conjunto escultórico, associado às colunas e outros detalhes que tornam o monumento único e marcante no imaginário e memória de todos, foi executado em Porto Alegre nas famosas oficinas de João Vicente Friedrichs. Château d'Eau - década de 1930 - Acervo Orlando Tischler Uma das ninfas do Château d'Eau - foto César Roos Netuno - foto Robispierre Giuliani Segundo Maria Júlia F. de Marsillac*, filha de João Vicente, com 15 anos o pai foi para a Alemanha estudar e lá se formou na Academia de Arte. Concluído o curso, o pai de João Vicente, Miguel Friedrichs, enviou-lhe uma quantia em dinheiro para que adquirisse material para a oficina que possuía em Porto Alegre. De posse dos recursos, João Vicente aproveitou para frequentar aulas de escultura, mosaico, galvanoplastia** e de adubos químicos, esquecendo de mandar notícias para a família. Com isto, Miguel Friedrichs pediu à polícia alemã...