O acervo documental do Arquivo Histórico abre janelas incríveis para o passado. Uma dessas janelas descortina um ofício datado de 11 de abril de 1831 e conduz para uma realidade de 190 anos atrás, quando a prática do sepultamento dos mortos nas igrejas e em seus entornos fazia parte do cotidiano nas vilas e cidades do Brasil recém-independente.
No ofício, assinado pelo vigário Ignacio Francisco Xavier dos Santos, que por longos 44 anos ficou à frente do comando da Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição (1798 - 1842), há uma pormenorizada circunscrição dos fatos envolvendo as questões de sepultamentos e as exigências legais que sempre os cercaram.
Eis o documento:
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Ofício do vigário - 11/4/1831 - CM/OF/Ofícios - Caixa 12 |
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Sequência do ofício do vigário - CM/OF/Ofícios - Caixa 12 |
Na sua longa carta ao presidente e mais vereadores da Câmara da Cachoeira, o vigário Ignacio Francisco discorreu sobre todas as providências que tomara para atender às disposições das autoridades sobre as regras de sepultamentos desde o ano de 1805, quando surgiu a primeira proibição de enterrar os mortos dentro das igrejas. Na ocasião, em comum acordo com o comandante da então Freguesia de Nossa Senhora da Conceição da Cachoeira, Sargento-mor Joaquim Severo Fialho de Mendonça, comprometeram-se a escolher um lugar para tal fora da povoação. No entanto, a Câmara em nada colaborou para que a obra tivesse andamento, de forma que no ano de 1827, atendendo acerto com o então Ouvidor Japi Assú, foi eleito o lugar para o cemitério fora da povoação, no Alto da Aldeia*, tendo o vigário feito a sua bênção. Porém, igualmente, nenhuma obra atinente à Câmara foi procedida, ou seja, seguia o local sem o devido muro e o altar exigido.
Ao contrário do que parecera ao Presidente da Província, disse o vigário jamais ter-se oposto ao cumprimento da ordem dada por ele anteriormente e que cabia à Câmara mandar amurar o Cemitério no Alto da Aldeia na forma determinada por Sua Majestade.
Em sua extensa explanação, seguiu o vigário dizendo que os sepultamentos prosseguiam a ser feitos atrás da Igreja Matriz, porque ele não tinha forças para constranger a Corporação da Irmandade do Santíssimo e de Nossa Senhora. Alegou também que o dito cemitério possuía dois portões, por onde atravessava a procissão dos defuntos, prática que os mais antigos, inclusive membros da Câmara, deviam lembrar-se de presenciar.
Por fim, o vigário afirmou que queria cumprir a lei, mas que para fazê-lo seria preciso que a Câmara também cumprisse com sua parte.
Reunidos os vereadores em sessão no dia 15 de abril de 1831, veio à pauta o ofício do vigário, estando ele presente para as discussões do que resultaria sua demanda. Ficou assim registrado na ata daquela sessão:
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Parte da ata da sessão de 15/4/1831 - CM/OF/A-002, fl. 141 |
Compareceo o Reverendo Vigario, e propondo-lhe a Camara a comferencia que delle exigio sobre o seu Officio de onze do corr. rellativo aos Cemiterios, forão por elle prestadas: ávista das quaes, com elle comcordou, que fique persistindo o Cemiterio na Aldeia, e que a Camara proceda ao amuramento, e feixamento do Cemiterio já solemnizado no lado occidental da Matriz para a Rua do Loreto, dando para isso as providencias percizas: pondo-se assim termo ás sepulturas dentro da Igreja: Neste acto retirou-se o vigario: e continuou a discussão sobre a forma de proceder-se ao amuramento do Cemiterio, e discutida a materia, rezolvêo-se officiar ás Irmand.es do S.S. Sacram.to Nossa Senhora, Rozario, e Almas, para em Sessão Extra-Ordinaria de 30 do corrente, comparecerem, e tractar-se deste negocio. (CM/OF/A-002, fl. 141).
Os representantes das Irmandades compareceram à sessão do dia 30, porém alegaram não estar em condições financeiras de arcarem com as despesas "extraordinárias" do muramento do cemitério. A história ainda se desenrolou por dois anos até que em 1833, finalmente, o vigário recebeu as chaves do Cemitério das Irmandades devidamente murado... pelo menos em parte.
Histórias da nossa longa e rica história!
*https://arquivohistoricodecachoeiradosul.blogspot.com/2017/11/um-cemiterio-para-vila.html
MR
Olá, bom dia, por gentileza, o Arquivo Histórico de Cachoeira do Sul, possui algum documento sobre as familias de cachoeira do sul dos anos 1850 em diante? Estou em Florianopolis, sc,fazendo uma pequisa genealógica, e alguns dados estão perdidos em Cachoeira do sul. Sabes me dizer por acaso se existem algum dados, digitais,para consulta, da igreja (seja de batismo, casamento ou falecimento) dos moradores mais antigos da cidade?
ResponderExcluirSó para constar, mais especificamente sobre a familia Pedroso, Borraz,
ExcluirOi, Ivair. O Arquivo Histórico dispõe de alguma coisa sobre genealogia, assim como a Diocese também tem registros que disponibiliza por solicitação. Favor enviar um e-mail para arquivohistorico@cachoeiradosul.rs.gov.br detalhando que nomes queres investigar. Se for possível, faremos uma busca ou te recomendaremos outras fontes.
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