Pular para o conteúdo principal

Hospital da Liga - uma obra para todos

Interessante recobrar a história de construção do Hospital da Liga Operária, o gigante do Bairro Barcelos, que se ergueu sob a batuta do maestro do operariado cachoeirense: o vereador José Nicolau Barbosa. E justamente agora que o município planeja desapropriá-lo para nele instalar o sonhado curso de medicina.

José Nicolau Barbosa apresentando a obra do Hospital da Liga Operária
- Acervo familiar

O sonho do Nicolau, como ficou conhecido o empenho que aplicou sobre a obra, nunca chegou a se realizar, uma vez que a edificação não pôde ser usada como hospital. Ainda assim, sem as condições necessárias para atendimento das exigências médico-sanitárias, o prédio de três andares vem abrigando a Secretaria Municipal de Saúde. Mesmo desvirtuado de seu projetado uso original, mantém o vínculo com o almejado e necessário atendimento da saúde do trabalhador cachoeirense.

O Jornal do Povo, edição de 1.º de março de 1964, traz uma entrevista com José Nicolau Barbosa, ocasião em que a reportagem do jornal fez uma visita à obra. A notícia publicada foi a seguinte:

Hospital da Liga Operária - Acervo José A. Pedroso

 Hospital da Liga Operária Deve Ser Uma Obra de Tôda Cidade

"Nesta obra está a mão de Deus e o coração dos homens de boa vontade com cuja ajuda estamos construindo o Hospital da Liga Operária", foram as primeiras palavras do Vereador José Nicolau Barbosa, ao levar um dos nossos repórteres até o local onde está em construção a futura Casa de Saúde do trabalhador cachoeirense.

Pudemos ver que realmente é uma obra gigantesca que, no dizer de José Nicolau Barbosa, não será da Liga Operária nem exclusivamente do operário: "será uma obra de Cachoeira para todos os cachoeirenses".

Lembrando que o Hospital de Caridade e Beneficência local foi inaugurado há 25 anos, quando em Cachoeira do Sul havia apenas uns cinco ou seis médicos e menos da metade da atual população, é evidente que atualmente a nossa única Casa de Saúde não pode suportar o número total de de doentes dêste e de outros municípios que aqui procuram hospitalização, mòrmente na categoria de indigentes.

José Nicolau Barbosa relatou-nos a descrença geral que enfrentou, tão logo teve a idéia de construir êsse hospital. Muitos aplaudiram a iniciativa, mas intimamente duvidaram de sua concretização, mesmo que remota. 

Dos dois e meio milhões de subvenção, até agora recebidos, gastou um milhão e cem mil cruzeiros com a compra do extenso terreno para o hospital. O restante do dinheiro e mais as contribuições do comércio, da indústria e do povo de Cachoeira ali estão representados pelo alicerce e as paredes que estão se erguendo aos poucos.

Os recursos foram esgotados. Apenas poucos operários estão trabalhando na obra, para que ela não pare nunca. Quando maiores são os recursos disponíveis, mais operários são empregados. Uma substancial verba no orçamento da Fronteira Sudoeste para o Hospital da Liga Operária, quando recebida, proporcionará um gigantesco avanço na construção. 

"Enquanto isso, vai-se lutando conforme Deus permite", disse o Vereador Barbosa. "Agora mesmo fizemos um contrato com a Codisul, para fornecimento de tijolos no valor de 400 mil cruzeiros, para pagamento dentro de 90 dias".

Ao encerrarmos a visita ao futuro Hospital da Liga Operária, o Vereador Barbosa pediu nossa opinião sôbre a obra.

Nossas palavras foram de que José Nicolau Barbosa, uma vez concluindo o Hospital, poderia sentir-se realizado em sua luta em prol do trabalhador cachoeirense, tal a sua magnitude, mas apressamo-nos em corrigir o conceito: José Nicolau Barbosa não é homem de dormir sôbre os louros, nem de fazer a fama e deitar-se na cama.

Êle terá sempre por que lutar e espera que sempre haja cachoeirenses de boa vontade, lutando a seu lado, para concretização das boas causas. 

Passados 60 anos da reportagem feita com o valoroso José Nicolau Barbosa, naturalmente surge o questionamento: pudesse ele responder à aspiração do município em relação ao prédio, o que diria? Iria se quedar à ideia de nele instalar um curso de medicina? 

MR

Comentários

  1. O título já oferta uma resposta para o questionamento. Hospital da Liga- Uma obra para todos. O sonho do velho Major era deixar um legado para a comunidade, queria oportunizar a "todos"o acesso a um atendimento médico de excelência, em especial a população carente, acredito que seja um claro desvio de finalidade e a morte de um sonho, de alguém que labutou pela construção, que enfrentou tantos obstáculos e que enfim realizou. Desapropriar e entregar para a iniciativa privada, que não têm nenhum vínculo mais forte com a cidade, seria um ato desprovido de cuidado com o bem comum, o bem de todos.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Casa da Aldeia: uma lenda urbana

Uma expressão que se tornou comum em nossos dias é a da "lenda urbana", ou seja, algo que costuma ser afirmado pelas pessoas como se verdade fosse, no entanto, paira sobre esta verdade um quê de interrogação!  Pois a afirmação inverídica de que a Casa da Aldeia é a mais antiga da cidade é, pode-se dizer, uma "lenda urbana". Longe de ser a construção mais antiga da cidade, posto ocupado pela Catedral Nossa Senhora da Conceição (1799), a Casa da Aldeia, que foi erguida pelo português Manoel Francisco Cardozo, marido da índia guarani Joaquina Maria de São José, é mais recente do que se supunha. Até pouco tempo, a época tida como da construção da casa era dada a partir do requerimento, datado de 18 de abril de 1849, em que Manoel Francisco Cardozo: querendo elle Suppl. Edeficar umas Cazas no lugar da Aldeia ecomo Alli seaxe huns terrenos devolutos na Rua de S. Carlos que faz frente ao Norte efundos ao Sul fazendo canto ao este com a rua principal cujo n

Bagunça na 7

Em 1870, quando a moral e os bons costumes eram muito mais rígidos do que os tempos que correm e a convivência dos cidadãos com as mulheres ditas de vida fácil era muito pouco amistosa, duas delas, Rita e Juliâna, estavam a infernizar moradores da principal e mais importante artéria da Cidade da Cachoeira. Diante dos "abusos" e das reclamações, chegou ao subdelegado de polícia da época, Francisco Ribeiro da Foncêca, um comunicado da Câmara Municipal para que ele tomasse as necessárias providências para trazer de volta o sossego aos moradores. Rua 7 de Setembro no século XIX - fototeca Museu Municipal A solicitação da Câmara, assinada pelo presidente Bento Porto da Fontoura, um dos filhos do Comendador Antônio Vicente da Fontoura, consta de um encadernado do Fundo Câmara Municipal em que o secretário lançava o resumo das correspondências expedidas (CM/S/SE/RE-007), constituindo-se assim no registro do que foi despachado. Mais tarde, consolidou-se o sistema de emitir as corresp