152 anos da morte de Antônio Vicente
Arquivo Histórico conseguiu a cópia do inquérito do crime que chocou o estado pós-farrapos
Antônio Vicente da Fontoura: levou três facadas e morreu depois de 42 dias
Há 152 anos, em 20 de outubro de 1860, Cachoeira do Sul perdia uma de suas figuras mais ilustres, o comendador Antônio Vicente da Fontoura. Reconhecido pelos títulos que acumulou ao longo dos seus 53 anos de vida e como Embaixador da Paz, Vicente da Fontoura entrou para a história ao atuar ativamente nas negociações e na assinatura da Paz de Ponche Verde, em 1845, documento que colocou um ponto final na Revolução Farroupilha. Seu assassinato se tornou uma história que desperta curiosidade por envolver brigas políticas, homens renomados, antigos amigos e traição.
Em 2010, a equipe do Arquivo Histórico de Cachoeira do Sul, em visita ao Arquivo Nacional, no Rio de Janeiro, localizou o processo criminal de 650 páginas com a investigação da morte de Antônio Vicente da Fontoura. O documento foi remetido para Cachoeira digitalizado, serviço pago por três cachoeirenses descendentes do comendador, que doaram o valor de R$ 670,00. Há também um processo no Arquivo Público do Rio Grande do Sul, o qual o grupo já tinha conhecimento.
Apesar de apresentar imagens bastante escuras, ele permite descobrir detalhes da investigação. O documento original, todo escrito à mão, está guardado no Arquivo Nacional. Segundo a diretora do Arquivo Histórico, Ione Sanmartin Carlos, entre os fatos relatados no processo está a bengalada que Vicente Fernandes de Siqueira desferiu contra Vicente da Fontoura para lhe distrair, a fim de que então Manoel Pequeno pudesse lhe dar as três facadas que lhe tiraram a vida.
HISTÓRIA - Para os historiadores, o inquérito da morte de Antônio Vicente da Fontoura é um documento especial, pois relata fatos, nomes, idades e mostra um pouco do ambiente hostil que Cachoeira do Sul viveu logo depois de elevada a categoria de cidade em 15 de dezembro de 1859.
Um crime dentro da Catedral
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Catedral: palco de um crime que chocou a província
Todo cachoeirense já entrou na Catedral Nossa Senhora da Conceição, um prédio construído em 1779. Porém, nem todos sabem que a igreja, hoje sede da Diocese de Cachoeira do Sul, já foi palco de um crime que chocou a então Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, hoje, o estado do Rio Grande do Sul. Foi dentro da Catedral, em 8 de setembro de 1860, que o comendador Antônio Vicente da Fontoura recebeu a bengalada e as três facadas que lhe tirariam a vida 42 dias depois, em 20 de outubro de 1860.
Sem os recursos da medicina de hoje em dia para curar os ferimentos, Vicente da Fontoura não resistiu a uma infecção. O clima eleitoral do dia 7 e 8 de setembro de 1860 para escolher os novos vereadores e juiz de paz (eleição que aconteceu dentro da igreja) não era nem um pouco amistoso. De um lado estava o partido Luzia (liberais) liderado por Vicente da Fontoura e o coronel José Gomes Portinho. Do outro, o Saquarema (conservadores) tendo como principais figuras os coronéis Hilário Pereira Fortes e Felisberto de Carvalho Ourique (que antes era seu amigo e compadre e, inclusive, lutou ao lado de Antônio Vicente, na Revolução Farroupilha).
MORTE PREMEDITADA - Como o prestígio de Vicente da Fontoura e Portinho era muito maior do que o dos demais, a vitória do partido Luzia era dada como certa. Premeditar a morte de Vicente da Fontoura era a forma de estabelecer o terror e o pânico entre os adversários.
Importante - Há relatos que apontam que Manoel Pequeno não queria cometer o crime. Ao ser chamado para atacar Antônio Vicente da Fontoura ele teria dito que “nestes tipos de assunto, o fim para os escravos era a morte ou o mato”. De fato, Manoel Pequeno chegou a fugir para o mato, mas acabou sendo capturado e condenado.
Manoel Pequeno, o escravo matador
A ordem do assassinato foi dada ao escravo liberto Manoel Pequeno, que tinha pertencido a Hilário Pereira Fortes, o Barão de Viamão. A liberdade de Manoel Pequeno era, em partes, devida ao próprio Vicente da Fontoura, que chegou a dar dinheiro para sua libertação. Em meio a um tumulto causado pela identificação de um votante, Vicente Fernandes de Siqueira aproveitou para dar uma bengalada em Vicente da Fontoura e lhe distrair para que Manoel Pequeno pudesse lhe dar as três facadas que atingiram seu ventre.
Em meio ao novo tumulto que se formou, Portinho subiu em uma cadeira e pediu ordem e calma aos seus companheiros de partido que queriam vingar a morte do chefe e amigo. Neste momento, se ouviu um tiro e logo depois o segundo e o terceiro. Dois atingiram a parede na direção em que estava Portinho e um pegou em sua farda, mas não o feriu.
Em meio ao novo tumulto que se formou, Portinho subiu em uma cadeira e pediu ordem e calma aos seus companheiros de partido que queriam vingar a morte do chefe e amigo. Neste momento, se ouviu um tiro e logo depois o segundo e o terceiro. Dois atingiram a parede na direção em que estava Portinho e um pegou em sua farda, mas não o feriu.
ESPADA - Segundo documento do Museu Municipal de Cachoeira do Sul, indignado, ele pegou a espada e partiu para cima de Hilário Pereira Fortes, colocando a ponta dela em seu peito. Apavorado, Pereira Fortes teria pedido para que não o matasse, pois era chefe de família. Ao retirar a espada de seu peito, Portinho teria dito “Não te mato porque não sou assassino como tu”. Sabia-se na época que, apesar de liberto, Manoel Pequeno continuava morando nas terras de Pereira Fortes, o que mostrava que eles ainda tinham ligação.
ATENÇÃO
O crime ainda é tema de mestrado e doutorado de vários estudiosos, até mesmo de não cachoeirenses e alguns deles estão disponíveis no Arquivo Histórico, assim como as cópias digitalizadas dos processos criminais.
Condenação por enforcamento
Os crimes ocorridos na Catedral resultaram em apenas uma punição, que foi a de Manoel Pequeno, condenado à morte por enforcamento. Não se sabe onde foi a sua execução, mas normalmente elas aconteciam em praça pública. Os demais coronéis (Hilário Pereira Fortes, Felisberto de Carvalho Ourique, José Pereira da Silva Goulart e Vicente Fernandes de Siqueira), todos os membros da elite local, apesar de terem sido presos, apresentaram defesa por escrito e foram despronunciados.
Enquanto estiveram presos, os senhores receberam várias manifestações de apoio de amigos. Na época, se a aplicação da justiça não fosse efetiva, era pelo menos teatralizada. Não era comum encontrar membros da elite econômica e política ingressando como réus nas cadeias públicas, mas era preciso dar uma explicação ao presidente da província, na época Joaquim Antão Fernandes Leão, que mesmo sendo conservador, teve que levar os senhores por um tempo para a cadeia.
Enquanto estiveram presos, os senhores receberam várias manifestações de apoio de amigos. Na época, se a aplicação da justiça não fosse efetiva, era pelo menos teatralizada. Não era comum encontrar membros da elite econômica e política ingressando como réus nas cadeias públicas, mas era preciso dar uma explicação ao presidente da província, na época Joaquim Antão Fernandes Leão, que mesmo sendo conservador, teve que levar os senhores por um tempo para a cadeia.
Em entrevista à Patrícia Mirando do Jornal do Povo, Ione Sanmartin Carlos deu informações sobre o atentado a Antônio Vicente da Fontoura. A reportagem acima saiu no jornal do final de semana, 19 e 20 de outubro de 2012.
Rico material sobre esse personagem histórico encontra-se à disposição dos interessados, aqui, no Arquivo Histórico.
Rico material sobre esse personagem histórico encontra-se à disposição dos interessados, aqui, no Arquivo Histórico.
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