Em 1922, um novo foco de peste bubônica pôs em alerta as autoridades municipais, assim como incidência de casos de varicela. Uma das providências tomadas, pelo receio de epidemia, foi a construção de um hospital de isolamento. A iniciativa de 1922 coincide com as medidas tomadas em 2020, quando em razão da pandemia da Covid-19 o município montou um hospital de campanha.
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Hospital de Campanha Covid-19 - Arquivo TV Cachoeira Novo Tempo |
A respeito do estado sanitário da cidade, o jornal O Commercio, de 8 de agosto de 1922, publicou o seguinte:
Peste bubonica
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8 casos fataes
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As providencias tomadas evitam a propagação do mal
Varias notas
Ha dias irrompeu na cidade, com caracter alarmante, a terrivel peste bubonica, sob a fórma pneumonica.
Dado o numero de casos fataes que se vinham verificando diariamente, a população ficou tomada de panico, a ponto de algumas familias se retirarem para fóra da cidade.
A molestia, que irrompera em uns cortiços da parte oeste da cidade, no local denominado Avenida Neco, já apparecia no Alto dos Loretos, de modo que o numero de casos fataes attingia a oito.
Diante, pois, da intensificação da epidemia, o dr. Annibal Loureiro teve, sabbado ultimo, longa conferencia com o dr. Balthazar de Bem, Delegado de Hygiene do Estado, combinando medidas energicas afim de debellar o terrivel mal que ameaçava a população.
Como medida preliminar foram mandados incendiar quatro predios onde se verificaram casos fataes da peste, tendo sido os demais, depois de desinfectados devidamente, rigorosamente isolados pela policia administrativa.
Acto continuo, a municipalidade ordenou a construcção de quatro pavilhões para isolamento dos pestosos, em o terreno de propriedade do municipio, situado na parte suleste da cidade, em local isolado.
Resolvida a construcção ás 17 horas de sabbado, 5 do corrente, ás 18 horas já estava adquirido todo o material e, depois de contractado o pessoal necessário, ás 21 horas foram iniciados os trabalhos de construcção, sob a immediata direcção do dr. João Protasio Pereira da Costa, esforçado e intelligente engenheiro-chefe da Secção de Obras Publicas Municipaes.
Assim providenciado, ás 12 horas de segunda-feira ultima já estavam completamente promptos, assoalhados, forrados, caiados e com installação de luz electrica, quatro pavilhões para isolamento dos pestosos.
Essas construcções abrangem: 2 pavilhões, de 32 mts2 cada um, para homens e mulheres, 1 pavilhão de 12 mts2 para necroterio, e 1 dito para a administração.
Verificando a necessidade de mais um pavilhão para refeitório, cosinha e quarto destinado ao cosinheiro, o dr. Annibal Loureiro mandou construir outro das dimensões de 19 mts2, o qual já se acha tambem prompto.
Desta fórma, daqui por diante a cidade terá o seu hospital de isolamento para recolher os enfermos atacados de molestias suspeitas, o que evitará, certamente, a propagação do mal.
Para essas construcções a municipalidade teve o auxilio relevante da Companhia Constructora de Santos, empreiteira das obras dos quarteis, que forneceu dois auto-caminhões, que ininterruptamente trabalharam noite e dia, abastecendo o serviço com o material necessario.
Igual auxilio prestou a Uzina Electrica, fornecendo fio electrico necessario ao prolongamento da rêde até ao local dos pavilhões, o que permittiu que dentro de poucas horas estivesse instalada a luz electrica.
Além desses trabalhos, a estrada para os pavilhões de isolamento foi toda concertada, afim de facilitar o trafego dos caminhões.
Segundo estamos informados, os trabalhos de construcção e materiaes empregados nos pavilhões, attingem cerca de 9:000$000.
Como se vê, a operosa e honrada administração municipal do dr. Annibal Lopes Loureiro, em acção conjuncta com o dr. Balthazar de Bem, delegado de Hygiene, não poupa esforços no sentido de acautelar a saúde publica, da terrivel epidemia que nos ameaçava.
Felizmente, graças ás energicas medidas tomadas, a peste está em declinio, podendo se considerar extincta, pois existem apenas 2 enfermos pestosos.
A população da cidade póde, pois, estar tranquila e confiar na acção prompta e eficaz dos poderes publicos, que tudo envidarão no sentido de defender a saúde publica do terrivel flagello.
Para que a obra fosse possível, o intendente abriu crédito especial para atacar as despesas com a construção, sancionando o Decreto n.º 140, de 7 de agosto de 1922:
Decreto 140, de 7 de agosto de 1922
No uso das attribuições que me confére a Lei Organica, attendendo ás exigencias da defeza sanitaria da cidade, ante a diffusão da epidemia denominada peste bubonica que, sob a fórma pneumonica atacou a população, fazendo muitas victimas, e de conformidade com a lettra b) do art. 2.º da Lei n.º 133, de 18 de novembro de 1921,
Decreto:
Art.º Unico - Fica aberto o credito extraordinario, até o maximo de quinze contos de reis, (15:000$000) para occorrer [sic] as despezas com a construcção de um Hospital de Izolamento, assistencia hospitalar, bem como para attender ao custeio dos serviços de prophylaxia que forem estabelecidos pela Secção de Hygiene e Assistencia Publica, e necessarios á extincção da peste bubonica. Intendencia Municipal, 7 de agosto de 1922.
Annibal Loureiro
(IM/GI/DA/ADLR-008, fl. 65)
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Decreto com assinatura do intendente Annibal Loureiro - IM/GI/DA/ADLR, fl. 65 |
Fonte: O Estado do Rio Grande do Sul, de Alfredo R. da Costa (1922) |
Na edição d'O Commercio de 16 de agosto, uma notícia alvissareira, atribuída às "enérgicas medidas tomadas pelas autoridades":
Está completamente extincta a peste bubonica. Graças ás energicas medidas tomadas pelas autoridades administrativas e sanitarias parece definitivamente dominado o surto violento da peste pneumonica na cidade.
Conhecido o fóco de onde irradiara a terrivel molestia, a acção erradicadora foi desdobrada por todos os meios possiveis, fazendo-se rigorosas desinfecções em pessoas e domicilios, incendiando-se os tugurios* onde se deram os casos fataes, distribuindo-se desinfectantes e insecticidas á população, emfim construindo rapidamente um hospital de isolamento para tratamento dos pestosos, conforme ja noticiamos em o ultimo numero desta folha.
O relatório apresentado ao Conselho Municipal pelo vice-intendente Francisco Fontoura Nogueira da Gama, no dia 20 de setembro de 1923, referiu as medidas profiláticas tomadas pelas autoridades para tentar conter o alastramento da doença no ano anterior:
Saude Publica
O estado sanitario da cidade, continua a ser satisfactorio.
A peste bubonica que, em fins de Julho de 1922 p. findo havia irrompido na cidade sob forma pneumonica, graças ás medidas prophylacticas postas em pratica pelos poderes publicos, extinguindo o fóco originario, não mais appareceu.
Tendo, em principios de junho do corrente anno, apparecido na cidade, alguns casos de varicella, de forma benigna, a Municipalidade tomou logo as providencias necessarias para combater essa epidemia, distribuindo vaccina ao corpo medico local, afim de vaccinar a população.
A mortalidade geral do Municipio, em 1922, foi de 541 obitos, contra 516 registrados em 1921, havendo, assim, um augmento de 25.
Na cidade, inclusive o 1.º districto, foram verificados 323 obitos, mais 42 do que os registrados no anno anterior, de 1921.
Esses pequenos augmentos perdem, porém, a sua significação, confrontando-se com a media por mil habitantes, verificados em os ultimos 5 annos (...)
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