Um quadro gráfico elaborado com capricho e à mão pela Secção de Estatistica da Intendência Municipal registra minuciosamente dados relativos à receita e à despesa do município de Cachoeira entre 1821 e 1920.
O servidor municipal que se atirou à tarefa de transpor os dados para o papel, quadriculou meticulosamente a folha acartonada, estabelecendo um comparativo de 200 anos, ou seja, desde o primeiro ano de existência da Vila Nova de São João da Cachoeira, quando a Câmara Municipal administrava os negócios públicos e disciplinava a vida dos cidadãos, até 1920, período da Intendência. Por essa época, a administração pública era comandada pelo intendente municipal e acompanhada em suas ações pelo Conselho Municipal, equivalente ao poder legislativo atual e então desempenhado pelos conselheiros.
Vamos aos dados. Em 1821, a receita da Vila Nova de São João da Cachoeira foi de 201.160 réis, ficando a despesa na casa de 173.593. Houve, portanto, uma sobra positiva de recursos, ainda que os montantes fossem modestos, o que se explica pelos primeiros tempos de autonomia política e administrativa, com todas as implicações de pôr em funcionamento uma nascente máquina pública.
Entre 1835 e 1845, período da Revolução Farroupilha, marcado pelo estado de guerra e suas drásticas consequências na economia, observa-se uma inversão, ou seja, despesas maiores que a receita, com arrecadação bem aquém do verificado anteriormente.
1836 - receita de 67.061 réis / despesa de 170.340 réis
1837 - receita de 186.200 réis / despesa de 201.980 réis
1838 - receita de 282.480 réis / despesa de 282.470 réis
1839 - receita de 840.102 réis / despesa de 913.708 réis
1840 - receita de 299.260 réis / despesa de 304.280 réis
1841 - receita de 467.570 réis / despesa de 432.339 réis
1842 - receita de 443.339 réis / despesa de 446.353 réis
1842 a 1845 - receita de 1:193.417 réis / despesa de 991.163 réis
1845 - receita de 3:199.027 / despesa de 3:223.265 réis
Entre 1861 e 1864, período em que estava sendo construída a Casa de Câmara, Júri e Cadeia, atual sede do Museu Municipal Edyr Lima, observa-se um substancial aumento da receita, certamente reforçada pelo aporte de recursos repassados pelo governo da Província para o custeio da obra:
1861 - receita de 8:638.315 réis / despesa de 3:288.693 réis
1862 - receita de 11:121.933 réis / despesa de 1:008.685 réis
1863 - receita de 16:291.993 réis / despesa de 3:310.987 réis
1864 - receita de 3:601.043 réis / despesa de 2:191.579 réis
Mesmo superavitária, a Câmara não cumpria rigorosamente com os pagamentos ao construtor, Ferminiano Pereira Soares, que inclusive morreu sem receber as últimas parcelas a que tinha direito!
As arrecadações da Câmara passaram bem pelo momento da Guerra do Paraguai (1864-1870) e se mantiveram firmes nos anos seguintes. Aqueles eram tempos já de resultados positivos pela implantação da Colônia Santo Ângelo, com boa produção agrícola.
Nos anos finais da década de 1870, o estabelecimento da Charqueada Paredão, primeira grande indústria do município, refletiu a força do empreendimento nos cofres municipais:
1878 e 1879 - receita de 24:481.770 réis / despesa de 20:166.523 réis
No ano de 1889, quando foi proclamada a República, as finanças responderam de acordo com o momento de transição entre o Império e a República e a natural insegurança advinda dessa mudança, quando os cofres municipais arrecadaram 13:377.930 e gastaram 15:920.642 réis.
Entre 1891 e 1895, outra vez a província do Rio Grande do Sul se viu convulsionada pela violenta Revolução Federalista. Os reflexos negativos na economia levaram os cofres da Intendência Municipal a praticamente empatarem em receita e despesa:
1891 - receita de 18:103.808 réis / despesa de 18:141.237 réis
1892 - receita de 18:128.808 réis / despesa de 18:045.641 réis
Nos anos de 1893 e 1894, houve boa reação, com receita superior à despesa, havendo equalização em 1895: receita de 62:406.943 réis e despesa idêntica.
Em 1899, com o início da construção do Teatro Municipal, a arrecadação despencou! Talvez resida aí a iniciativa do Coronel David Soares de Barcellos em apelar à comunidade e emitir apólices resgatáveis para dar conta da obra: receita de 71:523.494 réis e despesa de 76:504.432 réis!
Com as apólices, a arrecadação de 1900 elevou-se, suportando bem a despesa daquele ano: 83:119.502 contra 71:586.988 de gastos.
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Apólice emitida para construção do Teatro Municipal - IM/RP/SF/D-070 |
A partir de 1906, com o boom da lavoura de arroz, percebe-se um bom incremento nas rendas da Intendência, exceto no ano de 1919, véspera do centenário, quando a receita foi de 502:784.309 e a despesa de 516:770.576 réis. 1920 foi de burras cheias: receita de 537:558.583 réis e despesa de 498:588.274. Com o início da I Grande Guerra Mundial, em 1914, a arrecadação ficou abaixo dos gastos: 388:274.235 contra 389:700.419 réis.
Arrematando o quadro gráfico, uma representação geométrica da evolução das finanças da Câmara Municipal, desde o tempo do primeiro aniversário da instalação da Vila, quando partiu dos 100 mil réis, até chegar 100 anos depois, quando a arrecadação da Cidade da Cachoeira chegou aos 500 contos de réis.
Como se vê, o quadro gráfico da economia do município, no período de 1821 a 1920, permite entrever os diferentes momentos históricos e as suas influências negativas ou positivas nos cofres municipais.
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Quadro gráfico de receita e despesa entre 1821 e 1921 - IM/EA/SI/Quadros Demonstrativos - Caixa 17 |
MR
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