Pular para o conteúdo principal

Os submarinos

Às vésperas das comemorações do Dia da Criança, nada melhor do que ler um texto que mesmo sendo centenário, ainda hoje encanta e ressalta uma das características mais sublimes da infância: a inocência!

Os submarinos foi publicado no jornal O Commercio do dia 5 de janeiro de 1921, assinado por alguém que utilizava o pseudônimo X. X.

Os submarinos

O banho que eu aqui descrevi, ha dias, e em que tomaram parte, na chacara do "Bom Retiro", á beira do Parahyba, a joven d. Florinda e o seu travesso Alfredinho, trouxe-me á memoria, naturalmente, uma encantadora anedota de guerra, que eu li ou ouvi contar não sei como nem onde.

Á margem de um rio claro e pouco profundo, tomavam banho, uma tarde, sete ou oito creanças, de quatro a nove annos, entre as quaes uma menina, a Lili, irmã do Armindinho, que era, no grupo, o mais insupportavel e barulhento. Com a innocencia peculiar á idade, apresentavam-se todos despidinhos, nadando, mergulhando, pulando como um bando de golphinhos irrequietos.

https://www.tudodesenhos.com/d/menino-nadando-de-costas

O barulho que faziam era, como facilmente se imagina, ensurdecedor. Entregues a si mesmos, rolavam-se na areia, atiravam-se na terra, empurrando-se nadavam, ora de papo para baixo, com as mãos em movimento dentro dagua, no "nado de cachorro", batendo com os pés, na imitação dos navios de róda ou de barriga para o sol, agitando os braços rythmadamente, como escaleres em marcha pelo impulso regular de dois remos.

Estavam os pequeninos tritões no mais acceso do enthusiasmo, quando o Armindinho propôz, gritando:

- Vamos brincar de submarino?

- Vamos! - concordaram os outros, aos pulos, com o busto fóra dagua.

- Vamos?

Unindo o gesto á palavra, o Armindinho atirou-se á frente dos companheiros, nadando, agil, de peito para o ar, meio submerso, dando marcha ao corpo com o movimento das mãos debaixo d'agua.

Imitando o innovador, os outros pirralhos fizeram o mesmo, de papo para cima, pernas estiradas, silenciosos, como uma verdadeira flotilha de submersiveis.

Momentos depois, de volta á margem, iam repetir a proeza quando a Lili pediu nuasinha, batendo as mãos:

- Eu tambem vou! mano, eu tambem vou. Sim?

O Armindinho encarou-a, com a superioridade de um official allemão e protestou:

- Não, você não póde!

E virando-se para um dos companheirinhos, explicou, com a maior innocencia do mundo:

- Ella não tem periscopio.

X. X.

O Commercio, 5/1/1921, p. 2

Com esta história graciosa publicada há 100 anos, o Arquivo Histórico presta homenagem a todas as crianças no seu dia, inclusive as que ainda habitam o universo dos adultos.

MR

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Casa da Aldeia: uma lenda urbana

Uma expressão que se tornou comum em nossos dias é a da "lenda urbana", ou seja, algo que costuma ser afirmado pelas pessoas como se verdade fosse, no entanto, paira sobre esta verdade um quê de interrogação!  Pois a afirmação inverídica de que a Casa da Aldeia é a mais antiga da cidade é, pode-se dizer, uma "lenda urbana". Longe de ser a construção mais antiga da cidade, posto ocupado pela Catedral Nossa Senhora da Conceição (1799), a Casa da Aldeia, que foi erguida pelo português Manoel Francisco Cardozo, marido da índia guarani Joaquina Maria de São José, é mais recente do que se supunha. Até pouco tempo, a época tida como da construção da casa era dada a partir do requerimento, datado de 18 de abril de 1849, em que Manoel Francisco Cardozo: querendo elle Suppl. Edeficar umas Cazas no lugar da Aldeia ecomo Alli seaxe huns terrenos devolutos na Rua de S. Carlos que faz frente ao Norte efundos ao Sul fazendo canto ao este com a rua principal cujo n...

Instituto Estadual de Educação João Neves da Fontoura - 90 anos

O mês de maio de 2019 está marcado por um momento significativo na história da educação de Cachoeira do Sul. No dia 22, o Instituto Estadual de Educação João Neves da Fontoura chegou aos seus 90 anos carregando, neste transcurso de tempo, desafios, dificuldades e conquistas. Muitas crianças e jovens passaram por seus bancos escolares, assim como professores e servidores dedicados à desafiadora tarefa educativa. A história do João Neves, como popularmente é chamado aquele importante educandário, tem vínculos enormes com seu patrono. Em 1929, quando a instituição foi criada com o nome de Escola Complementar, o Dr. João Neves da Fontoura era vice-presidente do estado e há pouco havia concluído uma gestão de grandes obras como intendente de Cachoeira.  Em 1927, ano em que Borges de Medeiros resolveu criar escolas complementares no estado para a formação de alunos-mestres, imediatamente João Neves empenhou-se para que uma destas escolas fosse instalada em Cachoeira, município p...

Cachoeira do Sul e seu rico patrimônio histórico-cultural

A história de Cachoeira do Sul, rica e longeva, afinal são 202 anos desde a sua emancipação político-administrativa, legou-nos um conjunto de bens que hoje são vistos como patrimônio histórico-cultural. Muito há ainda de testemunhos desta história que merecem a atenção pelo que representam como marcas dos diferentes ciclos históricos. Mas felizmente a comunidade e suas autoridades, desde 1981, pela criação do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico-Cultural - COMPAHC, têm reconhecido e protegido muitas destas marcas históricas. Antes da existência do COMPAHC muitos e significativos bens foram perdidos, pois o município não dispunha de mecanismos nem legislação protetiva, tampouco de levantamento de seu patrimônio histórico-cultural. Assim, o Mercado Público, em 1957, e a Estação Ferroviária, em 1975, foram duas das maiores perdas, sendo estes dois bens seguidamente citados como omissões do poder público e da própria comunidade. Sempre importante lembrar que por ocasião do anúncio da...