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Construção dos quartéis

Em 1922, quando o governo federal anunciou que ergueria em Cachoeira um grande quartel para nele instalar um regimento de artilharia, o intendente Annibal Lopes Loureiro, com a aprovação do Conselho Municipal, ofereceu gratuitamente ao Ministro da Guerra local apropriado para a construção. Ao fazer a oferta, fez questão de propagandear as qualidades do município de Cachoeira, o que expressou em telegrama nos seguintes termos, transcrito no jornal O Commercio de 18 de janeiro de 1922:

(...)

Permita ponderar respeitosamente a V. Excia. ser esta cidade  localizada margem Viação Ferrea e grande rio Jacuhy, unica não possue força exercito, não obstante sua importancia e privilegiada situação geographica.

Entretanto, somos primeiro municipio agricola Estado, seu principal celeiro e um dos principaes na industria pastoril, com uma area superficial de 5.918 kilometros quadrados, servido magnificas estradas rodagem e população secenta mil habitantes.

Nossa produção, especialmente cereaes, dos quaes arroz concorre na proporção de 40%, atingiu anno passado, pelo valor oficial, a vinte e trez mil contos.

Exportação todos nossos productos tem oscilado entre dez e doze mil contos.

Cidade, cujo estado sanitario é excelente,  possui otima illuminação electrica, força motriz diurna e serviço de abastecimento d’agua, estando em vias realizar obras completas seu saneamento, podendo desde já serem feitas no quartel a construir-se respectivas installações.

Pelo exposto, desejando atrair mais um poderoso fator progresso local, o qual coincide patriotica elaboração plano defesa nacional, solicitamos, se não  houver inconveniente, que V. Excia. ordene possivel brevidade inicio obras aquartelamento.

Respeitosas saudações.

Foram providenciais as informações sobre o município que o intendente Annibal Loureiro prestou ao Ministro Pandiá Calógeras, assim como a interferência dos deputados João Neves da Fontoura e Octavio Rocha, pois o plano de remodelação do exército, posto em prática naquela ocasião, reestruturou a alocação de unidades militares no país. Cacequi, onde seria instalado o 3.º Batalhão de Engenharia, teve sustada a obra por não preencher o município os fins exigidos para o aquartelamento. Assim, Cachoeira foi contemplada com mais aquele quartel, o que assegurou pessoalmente o Ministro Calógeras ao intendente Annibal Loureiro em encontro na cidade de Santa Maria, em março de 1922, onde o primeiro estava em inspeção das obras dos quartéis lá em construção.

O município fez a doação de área que adquiriu dos senhores Virgilio Carvalho de Abreu, Christovão Zinn e Antonio Marques Ribeiro, além de ter sido contratada com outros proprietários a aquisição de parte restante, tudo de acordo com orientação do Ministério da Guerra. Os terrenos estavam situados a oeste da cidade e próximos do rio Jacuí e da linha férrea. A Lei N.º 134, de 26 de outubro de 1922, autorizou o negócio. 

As pedras fundamentais dos quartéis foram implantadas em 2 de abril e 7 de setembro de 1922 e as obras ficaram a cargo da Companhia Construtora de Santos, sob a direção do engenheiro Gastão Dessart.

Material encontrado sob a pedra fundamental do 3.º BE Cmb,
vendo-se fragmentos do catálogo da Companhia Construtora de Santos
- Acervo 3.º BE Cmb

O relatório do vice-intendente em exercício, Francisco Fontoura Nogueira da Gama, apresentado ao Conselho Municipal em 20 de setembro de 1923 e publicado no jornal O Commercio, detalhou a situação das construções naquela altura do ano:

Vão bastante adeantadas as obras militares iniciadas nesta cidade pela Companhia Constructora de Santos, por conta do Governo Federal.

Essas construcções constam de dois quarteis, sendo um destinado ao 3.º Batalhão de Engenharia, actualmente aquartellado em São Gabriel e o outro para o 3.º Regimento de Artilharia Pesada, alojado na margem de Taquary. 

O Quartel para o 3.º Batalhão de Engenharia consta de um pavilhão para a Administração, 3 pavilhões de Alojamento, um Rancho e Cosinha, um para Intendencia, 3 para Baias, um para Enfermaria, um grande deposito para material de pontoneiros e um para paiol.

Os quatro primeiros teem dois pavimentos.

A superficie total das construcções é superior a 12.000 metros q., estando o custo das obras orçado em Rs. 1.735:227$953.

Lançado em dois de abril de 1922 o marco inicial, foram atacadas as obras em fins de maio do mesmo anno, devendo o Quartel ser inaugurado no mez de outubro proximo, depois de 16 mezes de iniciada  construcção.

O Quartel para o 3.º Regimento de Artilharia Pesada, consta de 2 pavilhões de Administração, 9 pavilhões de Alojamento, 1 para Enfermaria, 3 para rancho e cosinha, 1 para lavanderia, 2 picadeiros, 9 para baias e 1 para paiol. Os 11 primeiros pavilhões teem dois pavimentos e os demais um só.

A superficie total das construcções é de 20.000 metros quadrados, estando o custo das obras orçado em Rs. 2.830:480$960.

O  marco inicial foi lançado em 7 de setembro de 1922, e as obras deverão estar concluidas em maio de 1924.

Actualmente estão concluidos os pavilhões destinados a Lavanderia e Enfermaria, achando-se em franco andamento outros cinco pavilhões.

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Os quarteis disporão de todo o conforto moderno, cosinhas a vapor, lavanderia a vapor, luz electrica, telephones internos, installações sanitarias,  agua abundante e encanada por todos os pavilhões.

A água é fornecida por um poço semi-surgente, de 135 metros de profundidade, que produz por meio de um compressor pneumatico, dez mil e oitocentos litros de agua, por hora.

A Companhia contractante tenciona construir uma pequena usina electrica de 90 HP, de capacidade, para fornecer luz e energia aos quarteis.

O "effluente" dos exgottos dos quarteis será lançado por uma estação elevatoria no collector geral da cidade.

Annexa ás obras tambem funcciona uma fabrica de ladrilhos hydraulicos, que fornece tambem ás obras dos demais quarteis que a Companhia está  construindo no Estado. Esta fabrica já produziu mais de 35.000 metros quadrados de ladrilhos de diversos typos.

Os materiaes denominados "grossos", tem sido adquiridos, quasi na sua totalidade, neste Municipio, importando sómente materiaes que offerecem vantagem em preços.

O pessoal das obras e escriptorios, tambem tem sido escolhido  de preferencia no elemento existente nesta cidade.

A Companhia despendeu até esta data, em Cachoeira, com a compra de materiaes e salarios pagos ao pessoal e empregados, mais de 1.870:000$.

As obras se acham sob a direcção do illustre engenheiro dr. Gastão Dessart.

Como se deprehende da descripção acima, essas obras militares são importantissimas, que concorrerão, certamente, com o proximo alojamento dessas numerosas Forças do Exercito, para o desenvolvimento e progresso da cidade.

Usando das atribuições que lhe outorga a Lei n.º 134, de 26 de abril de 1922, a Municipalidade tem adquirido e doado ao Governo Federal, os terrenos necessarios ás construcções de tão importantes obras militares.

Alem dos terrenos comprados aos srs. Virgilio de Abreu, Christovão Zinn e Antonio Marques Ribeiro, no corrente anno foi adquirido um outro da herança de Constantino Ribeiro, com a extensão de 13.498,mts.42 [sic], pelo preço de 5:000$000.

(O Commercio, 3/10/1923, p. 2 - suplemento).

Construção do 3.º BE (20/11/1922) - Acervo do 3.º BE Cmb

Instalações atuais do 3.º BE Cmb - foto Robispierre Giuliani

Instalações do 13.º GAC - foto Robispierre Giuliani

As unidades militares de Cachoeira do Sul foram grandes conquistas do passado e prestam um serviço inequívoco à comunidade sempre que solicitadas. São também reconhecidas nacionalmente como referências na organização e ações que empreendem. 

MR

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