Pular para o conteúdo principal

Cachoeira quer um posto agronômico

O município de Cachoeira do Sul sempre teve na agricultura um dos pilares da sua economia. Ao longo de sua história apresentou diferentes ciclos produtivos, sendo o cultivo do arroz um dos mais bem-sucedidos deles.

No ano de 1906, quando a irrigação artificial das lavouras dava seus primeiros passos, os produtores começaram a experimentar a necessidade de assistência técnica, pois também grande era o incentivo do governo Borges de Medeiros na qualificação e melhoria dos campos, entendida esta melhoria como aperfeiçoamento não só na agricultura como também na pecuária. E foi justamente naquele ano, no dia 22 de julho, nas dependências do Teatro Municipal, que foi criado o Sindicato Agrícola Pastoril Cachoeirense. O cenário local ensejou o governo intendencial, então nas mãos do Dr. Cândido Alves Machado de Freitas, a se reportar às autoridades estaduais solicitando que fosse instalado no município um posto agronômico.

No dia 21 de agosto de 1906, respondendo ao pedido, José Barboza Gonçalves, da Diretoria Central da Secretaria de Estado dos Negócios das Obras Públicas, enviou o ofício número 1374 dizendo o que segue:

Estado do Rio Grande do Sul
Porto Alegre, 21 de Agosto de 1906.

Ao Sr. Intendente da Cachoeira.

Em solução do vosso officio nº 224 de 6 do corrente mez declaro-vos, de ordem do Sr. Presidente, que estando resolvido entregar-se aos municipios os postos agronomicos existentes, ficando apenas a cargo do Estado a Estação Agronomica, deixa por isso a Administração de attender o vosso pedido, acreditando porem que o syndicato agricola pastoril cachoeirense com o auxilio dessa Intendencia poderá conter e manter em condições satisfatorias o posto agronomico que desejaes para essa cidade.

Saúde e Fraternidade.

                         José Barboza Gonçalves

Ofício n.º 1374 - 21/8/1906 - IM/OPV/CCP/Ofícios - Caixa 16

No ofício acima transcrito, José Barboza Gonçalves cita acreditar que o Sindicato Agrícola Pastoril Cachoeirense, então recém-criado, teria condições de manter o posto agronômico de Cachoeira. Bem, a julgar pela diretoria aclamada na data da fundação, estava ele com a razão, pois dentre os seus membros constavam pioneiros na irrigação artificial e bem-sucedidos produtores: João Jorge Krieger, Jorge Franke, Sabino Pereira da Silva e João Baptista Carlos, dentre outros, além do mecânico responsável pela proeza de levar a água até as lavouras, José Albino Pohlmann.

No dia 11 de dezembro, novo ofício, de número 2152,  da mesma autoridade, José Barboza Gonçalves, remetido ao intendente Cândido Alves Machado de Freitas:

Estado do Rio Grande do Sul
Porto Alegre, 11 de dezembro de 1906.

Ao Snr' Intendente Municipal da Cachoeira

Em resposta ao vosso officio n.º 237 de 11 de Setembro, em que solicitaes solução aos de n.ºs 224 e 227 de 16 de Agosto, tudo do corrente anno, tratando respectivamente da creação de um posto agronomico n'esse municipio e da reconstrução da ponte sobre o Jacuhy, tenho a declarar-vos, quanto ao primeiro, que o assumpto foi opportunamente resolvido em officio meu, n.º 1274 de 21 do citado mez de Agosto, e, quanto ao segundo, que os reparos provisorios da ponte referida foram já contractados, de ordem d'esta Secretaria, pelo conductor Octavio Rodrigues da Silva, dependendo o inicio das obras definitivas apenas da chegada ao respectivo local das madeiras necessarias aos trabalhos, que, entretanto, estariam já realizados si essa Intendencia não houvesse recusado a incumbencia de receber e zelar pela conservação do dito material.
As obras em questão, estando, como acabo de vos communicar, sob a administração d'esta Secretaria, julgo dispensavel o concurso, que offereceis, do engenheiro municipal.

Saude e Fraternidade.

José Barboza Gonçalves


Ofício n.º 2152- 11/12/1906 - IM/OPV/CCP/Ofícios - Caixa 16

Neste segundo ofício, fica claro que a Intendência não cumpriu com sua parte, ou pelo menos não concorreu com a agilidade necessária para a outra demanda apresentada, que era a reconstrução da ponte sobre o rio Jacuí, destruída no final do século XIX e importantíssima condição para alavancar especialmente a pecuária e a indústria pastoril, representada pela importante Charqueada do Paredão.

Como se vê, a história se repete e, infelizmente, parece não se fazer lição para o futuro que os interesses dos cidadãos têm que encontrar ressonância na máquina pública.

MR

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Casa da Aldeia: uma lenda urbana

Uma expressão que se tornou comum em nossos dias é a da "lenda urbana", ou seja, algo que costuma ser afirmado pelas pessoas como se verdade fosse, no entanto, paira sobre esta verdade um quê de interrogação!  Pois a afirmação inverídica de que a Casa da Aldeia é a mais antiga da cidade é, pode-se dizer, uma "lenda urbana". Longe de ser a construção mais antiga da cidade, posto ocupado pela Catedral Nossa Senhora da Conceição (1799), a Casa da Aldeia, que foi erguida pelo português Manoel Francisco Cardozo, marido da índia guarani Joaquina Maria de São José, é mais recente do que se supunha. Até pouco tempo, a época tida como da construção da casa era dada a partir do requerimento, datado de 18 de abril de 1849, em que Manoel Francisco Cardozo: querendo elle Suppl. Edeficar umas Cazas no lugar da Aldeia ecomo Alli seaxe huns terrenos devolutos na Rua de S. Carlos que faz frente ao Norte efundos ao Sul fazendo canto ao este com a rua principal cujo n...

Instituto Estadual de Educação João Neves da Fontoura - 90 anos

O mês de maio de 2019 está marcado por um momento significativo na história da educação de Cachoeira do Sul. No dia 22, o Instituto Estadual de Educação João Neves da Fontoura chegou aos seus 90 anos carregando, neste transcurso de tempo, desafios, dificuldades e conquistas. Muitas crianças e jovens passaram por seus bancos escolares, assim como professores e servidores dedicados à desafiadora tarefa educativa. A história do João Neves, como popularmente é chamado aquele importante educandário, tem vínculos enormes com seu patrono. Em 1929, quando a instituição foi criada com o nome de Escola Complementar, o Dr. João Neves da Fontoura era vice-presidente do estado e há pouco havia concluído uma gestão de grandes obras como intendente de Cachoeira.  Em 1927, ano em que Borges de Medeiros resolveu criar escolas complementares no estado para a formação de alunos-mestres, imediatamente João Neves empenhou-se para que uma destas escolas fosse instalada em Cachoeira, município p...

Série: Centenário do Château d'Eau - as esculturas

Dentre os muitos aspectos notáveis no Château d'Eau estão as esculturas de ninfas e Netuno. O conjunto escultórico, associado às colunas e outros detalhes que tornam o monumento único e marcante no imaginário e memória de todos, foi executado em Porto Alegre nas famosas oficinas de João Vicente Friedrichs. Château d'Eau - década de 1930 - Acervo Orlando Tischler Uma das ninfas do Château d'Eau - foto César Roos Netuno - foto Robispierre Giuliani Segundo Maria Júlia F. de Marsillac*, filha de João Vicente, com 15 anos o pai foi para a Alemanha estudar e lá se formou na Academia de Arte. Concluído o curso, o pai de João Vicente, Miguel Friedrichs, enviou-lhe uma quantia em dinheiro para que adquirisse material para a oficina que possuía em Porto Alegre. De posse dos recursos, João Vicente aproveitou para frequentar aulas de escultura, mosaico, galvanoplastia** e de adubos químicos, esquecendo de mandar notícias para a família. Com isto, Miguel Friedrichs pediu à polícia alemã...